Toda vez que uma palavra ou expressão cai em uso cotidiano, se diz que virou senso comum. Talvez, de certa maneira, comum não seja bem o adjetivo a ser empregado para este fenômeno.

Quem sabe, senso banal seja mais apropriado para o que tem ocorrido com a transgressão e reducionismo do significado das coisas e seu emprego desprovido de conhecimento.
Por banal se entende aquilo que é trivial, pífio, sem relevância, digno de pouco caso. Já por ‘comum’ podemos entender aquilo que é habitual e que é acessível a todos. Não podemos dizer que deixe de ter certa relevância.
Buscar viver é comum a todos os humanos, porém, não seria correto dizer que buscar viver seja algo banal. Da mesma forma, beber água é algo comum, mas passa longe de ser banal, apenas para ilustrar.

temos visto e ouvido que um sem número de pessoas, a grande maioria para ser mais justo, a fim de tentar parecer mais aceitável, pop, moderno ou outra ilusão qualquer, se vale de expressões que aos poucos começam a perder seu real e profundo significado.
Isto se aplica perfeitamente aos discursos emblemáticos de homens públicos, sejam eles políticos ou não. Mas, esse cacoete se estende a todos nós.

É o caso, dentre muitos outros, da palavra ‘sustentabilidade’.
Não, não quero ser teórico, mas neste momento é cabido, afinal, como diz o grande Prof. Mário Cortella, “o conhecimento serve para encantar pessoas, não para humilhá-las”.
Em 1987, foi cunhado tanto o termo desenvolvimento sustentável quanto o de sustentabilidade. Segundo o Relatório Brundtland, desenvolvimento sustentável é aquele que atende às necessidades do momento presente, sem deixar de garantir ou comprometer a capacidade das gerações futuras de atender às suas próprias necessidades.
Esta noção se opõe ao modelo de desenvolvimento baseado em predação ecológica, perversidade política e injustiça social, o qual vem marcando nosso mundo desde a Revolução Industrial e ainda não foi abandonado pela grande maioria das pessoas, empresas e governos.
A noção de sustentabilidade adotada pela Agenda 21 Brasileira vai muito além dos aspectos econômicos, sociais e ambientais do desenvolvimento, ampliando sua abrangência ao incorporar as dimensões culturais, ecológicas, pedagógicas, demográficas, culturais, institucionais, espaciais e imagéticas ou simbólicas.
É uma noção plena de sentido e de propósito.
É risível a situação de empresas ou marcas que se defendem enquanto sustentáveis quando, na verdade, não o são.
Em sua grande parte, privilegiam o uso do automóvel particular, estendendo sua praça de estacionamento, elitizando quem o tem e discriminando os funcionários usuários de transporte coletivo.

Ironizamos, porém:
“Chegar de bicicleta ao trabalho, nunca! Proporcionar que o funcionário que optar pela bicicleta tenha um vestiário para fazer sua higiene e trocar de roupa? Impossível, não está nos custos! Realizar campanhas que falem do aporte à saúde física e mental, além das inúmeras recompensas que o ato de pedalar proporciona? ‘Cê tá de brincadeira, né?’!”
Em outras situações, tais empresas chegam ao limiar do oportunismo, valendo-se da imagem da bicicleta em sua publicidade, de maneira vazia, apenas para não perder o bonde da história. Já perdeu!
Este ano, 2022, é ano de eleições no país do futebol e do ‘andar de bicicleta é coisa de pobre’!
Será a vez dos discursos rasos dos candidatos, repetindo ‘vamos estar fazendo’ e todo mundo fazendo cara de ‘vamos estar acreditando’! O lado obscuro do gerúndio mal empregado é que ele poucas vezes acontece de verdade.
Em nome do tal desenvolvimento insustentável virão as tais promessas inconsistentes de promover crescimento fazendo mais estradas, entre tantas asneiras que fariam o velho Odorico Paraguaçu, o assumido político corrupto interpretado pelo grande Paulo Gracindo, dizer em alto e bom som:
“Meu caro editor ciclopopulista, isso me deixa bastantemente entristecido, com o coração afogado na daceptude e na desgostice. Numa hora em que procuro arrancar o azeite-de-dendê do estágio retaguardista do manufaturamento (...), você me vêm com esse acusatório ciclomobilizante destabocado somentemente porque meia dúzia de baiacus apareceram mortos na praia e pouquecentas árvores se desmilinguiram!".
Sustentabilidade não é brincadeira. Não é moda!
Não é um decalque que se adere a uma marca, produto, campanha, nome.
É um modo de ser no mundo.
E, o nosso modo de ser no mundo promove a bicicleta.
A bicicleta é sustentável por ser o veículo da sustentabilidade, ou seja, seu usuário leva sustentabilidade ao praticá-la. Imaginem o quão profundo seja isto. Nunca é demais repetir, e o faremos tantas vezes seja necessário, porque não é banal:
“que a bicicleta é o meio de transporte não-natural, ou seja, inventado pelo homem, economicamente viável, socialmente justo, ambientalmente responsável, culturalmente repercutido, ecologicamente assumido, pedagogicamente recriável, demograficamente percebido, institucionalmente requerido, espacialmente saudável, imageticamente comunicável e simbolicamente aprazível – Therbio Felipe”.
Dizer que a bicicleta é sustentável chega a ser um pleonasmo intencional, não vicioso, mas que nos damos o direito, certo Odorico?
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